sábado, 29 de dezembro de 2012

Ciência poética


A Ciência pode ser muito romântica, principalmente em jornadas de exploração, seja por terra, água, ar ou espaço. Quando se trata de batizar suas ferramentas, os homens da ciência não deixam de prestar honras e homenagens aos seus heróis, reais ou ficcionais.

No Post da madrugada de hoje, vamos desvendar os segredos por trás dos nomes dos Ônibus Espaciais, os mais charmosos veículos espaciais do século XX. 




Enterprise

A Enterprise e o elenco de Jornada nas Estrelas
Willian Shatner (o Capitão Kirk) não aparece na foto pois
estava na cabine tentando acionar os motores de dobra

O primeiro ônibus espacial serviu como modelo de testes e nunca chegou ao espaço, mas os cientistas da Nasa homenagearam um dos mais audacioso e queridos bólidos espaciais: a USS Enterprise da série Jornada nas Estrelas, a nave que foi onde nenhum homem jamais esteve. 

Originalmente a nave seria batizada de Constitution, mas uma campanha organizada por fãs da série dirigiram cartas ao presidente Gerald Ford para que o ônibus espacial fosse batizado com o nome Enterprise. Embora nunca tenha citado a campanha, Ford anunciou a técnicos da Nasa que era partidário do nome Enterprise, o que auxiliou na mudança. Em 1994, para delírio dos trekkers, o ônibus espacial foi exibido em convenções de Jornada nas Estrelas (fãs de Star Wars, superem essa!!!). 

No primeiro longa-metragem de Star Trek, uma cena mostra várias versões da Enterprise, incluindo navios famosos e o Ônibus Espacial. Os produtores devolveram a homenagem, insinuando que as naves da Federação dos Planetas Unidos batizadas de Enterprise homenageavam o protótipo da Nasa.

Qualquer dia faço um post sobre os veículos com o nome Enterprise, incluindo os ficcionais da série Jornada nas Estrelas. 

Columbia

Robert Gray

O segundo ônibus espacial recebeu um nome folclórico e histórico para os norte-americanos. O nome é ligado aos feitos do Capitão Robert Gray, o primeiro americano a realizar uma viagem ao redor do planeta. Entre os seus outros feitos estão a abertura de rotas comerciais entre a costa oeste americana e o Pacífico e as viagens de exploração no ano de 1792 que resultaram no batismo do Rio Columbia. O módulo de controle da Apolo 11, primeiro veículo tripulado a realizar um pouso na Lua também recebeu o nome Columbia. 

Challenger

HSM Challenger por William Frederick Mitchell


O terceiro ônibus espacial é mais lembrado pelo acidente fatal ocorrido em 1987, foi batizado em homenagem ao corvete britânico HMS Challenger que realizou uma expedição marítima ao redor do planeta entre 1872 e 1876. O Módulo Lunar da Apolo 17 também recebeu o mesmo nome. 

Discovery

Os navios Resolution e Discovery


O nome do quarto ônibus espacial se adequá bem a missão dos veículos espaciais e segue uma longa tradição de pesquisa e exploração, a começar pela frota do capitão James Cook explorador britânico  que em sua terceira e última missão de exploração ao Oceano Pacifico, capitaneou o Navio Discovery entre os anos de 1776 e 1779. 

Outro Discovery (não achei imagens) foi utilizado entre 1610 e 1611 para descobrir a Passagem Noroeste, rota pelo mar ao norte do Canada e Alasca que permite a comunicação marítima entre o Atlântico e o Pacífico. O Navio contribuiu ainda com a fundação de Jamestown, primeiro assentamento britânico no novo continente.

HSM Discovery


Dois Discoverys foram responsáveis pelas explorações dos Polos Norte e Sul. O HSM Discovery foi utilizado por George Nares e em sua expedição pelo Ártico entre 1875/76. 


RSS Discovery

Entre os anos de 1901 e 1904, os capitães Robert Falcon e Ernest Shackleton, sob serviços da Royal Geographical Society realizaram a "Expedição descoberta da Antártida" no RSS Discovery.


Atlantis

RV Atlantis


O quinto ônibus espacial recebeu o nome do RV Atlantis, um veleiro de dois mastros que serviu de base de pesquisas para o Instituto Oceanográfico Woods Hole entre os anos de 1930 e 1964. O navio ainda está na ativa com outro nome - "El Austral" - prestando serviços científicos ao Consejo Nacional de Investigaciones Cientificas y Técnicas (CONICET) da Argentina desde 1966.


Endeavour

Endeavour


O sexto e último ônibus espacial foi batizado em homenagem ao navio de pesquisas Endeavour comandado pelo navegador inglês James Cook em sua primeira viagem de exploração ao Oceano Pacífico no século XVIII. Lançado em 1764, foi adquirido pela Marinha Real Britânica em 1768, permanecendo em atividade até 1775. A missão da embarcação era explorar o Pacifico em busca da Terra Australis Incógnita ou a "Desconhecida Terra ao Sul". Uma réplica da Endeavour foi lançado em 1994 e está ancorado ao lado do Australian National Maritime Museum em Sydney. O batismo também é uma homenagem ao módulo de comando da Apollo 15.



Pioneiros, por hoje é só. 

See you!

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Relembrando a infância com os grandes mestres

Nos últimos anos voltei a ler quadrinhos da Disney por dois bons motivos: os lançamentos no Brasil das "Obras Completas de Carl Barks" e das histórias de Keno Don Rosa.




O Homem dos Patos
Conhecido como "O homem dos patos" Barks redigiu e desenhou histórias do Pato Donald e Tio Patinhas por mais de 20 anos. Considerado um gênio por crítica e público, o autor escrevia gags de uma página com a mesma desenvoltura das grandes aventuras de 28 páginas. É creditado a Barks a criação de personagens como Tio Patinhas, Professor Pardal, Maga Patalógica e Irmãos Metralha e a corporação "Escoteiros Mirim".


As Obras Completas de Carl Barks
Através das mais de 4 mil páginas, reunidas nas 41 edições de "Obras Completas", milhões de jovens tiveram o primeiro contato com lendas clássicas (a cidade de Atlântida, o holandês voador), contos mitológicos (o velo de ouro, a pedra filosofal, as minas do rei Salomão) e fatos históricos reais (a corrida do ouro em Klondike, a expansão do império de Gengis Khan, a queda dos Maias). Por suas contribuições, Barks foi indicado para o "The Will Eisner Awards Hall of Fame" em 1987.

O Homem dos Patos não era apenas um grande contador de histórias. Ele estava a frente de seu tempo em vários campos de discussões como a preservação do meio ambiente e a alienação causada pela grande mídia.

Outro ponto nevrálgico tocado pelas histórias de Barks era a pobreza nos Estados Unidos. O tema era tabu nos anos 50, um período de aparente prosperidade, em especial para a classe média dominante. Na história "O trenzinho da alegria", vários personagens de Patópolis unem-se para proporcionar um Natal mais alegre para as crianças da Vila Barraco.




A influencia cultural da obra de Barks pode ser averiguada em "As Minas do Rei Toleimon". Da história publicada em junho 1959 na revista "Uncle Scrooge 26", Steven Spielberg tirou duas cenas para os filmes de Indiana Jones: A pedra que rola atrás do Dr. Jones em "Caçadores da Arca Perdida" e a cena de perseguição final de "O Templo da Perdição" (vide abaixo).


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O Mestres dos Patos


O "homem dos patos" deixou muitos discípulos, mas coube a Keno Don Rosa o título de herdeiro legitimo de Barks e a acunha de "mestre dos patos". O autor conquistou público e crítica por sua arte detalhada, e por seus roteiros com tempero único.

Boa parte das histórias de Don Rosa dá continuidade as aventuras escritas por Barks, amarrando pontas soltas deixadas pelo mestre. Entretanto, o maior atrativo é a forma como o autor dá profundidade aos personagens e suas relações.

Embora Donald continue a ser o pato com todos aqueles defeitos ao qual nos acostumamos (e adoramos), nas histórias de Don Rosa, ele é apresentado de uma forma mais madura, como um adulto com responsabilidades. E essa responsabilidade é direcionada especialmente à criação dos seus três sobrinhos. Um exemplo da atenção dada a Huguinho, Zezinho e Luizinho pode ser verificada na história "De olho nos detalhes".



Escondido na piada está o nível de observação desenvolvido por Donald, que consegue enxergar os trigêmeos idênticos como indivíduos singulares. É o mesmo nível de diferenciação adquirido por atenciosos pais de gêmeos, preocupados em respeitar a singularidade de seus filhos.

Além da maturidade, Don Rosa concede ao Donald uma língua ferina que destila sarcasmo e ironia sobre as atitudes do seu tio Patinhas, a quem considera exageradamente excêntrico e extremamente ganancioso.



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Don Rosa tem um incrível talento para a síntese. Ele é capaz de dizer em poucos quadrinhos o que outros escritores levariam várias edições. Essa qualidade é especialmente útil para redimensionar os personagens de uma forma sutil. Um exemplo é o diálogo entre Panchito, Zé Carioca e Donald na história "O retorno dos três cavaleiros". Os personagens discutem sobre seus projetos futuros financiados pelo tesouro que recém haviam descoberto. Donald foge do cliché e dá uma resposta surpreendente:


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O pato ganha a admiração sincera dos seus amigos e os leitores ganham uma visão inédita do personagem da Disney. Passei a admirar mais a figura do Donald após a leitura dessa história e acredito que muitos outros leitores também. 


Emoção juvenil

Os personagens que mais amadureceram pelas mãos de Barks foram Huguinho, Zezinho e Luizinho. De pequenos arruaceiros transformaram-se em exemplares cidadãos ao integrar as fileiras dos Escoteiros Mirins. Entretanto, os patinhos nunca expressaram verdadeiramente seus sentimentos nas histórias do "Homem dos Patos". Coube a Don Rosa desenvolver esse ponto. 



Pela pena de Don Rosa temos o único lamento proferido pelos trigêmeos sobre a morte de seus pais em mais de 70 anos de quadrinhos Disney. 




A biografia

O maior destaque da carreira do autor é a biografia oficial do Tio Patinhas, laureado com o Will Eisner Awards, o Oscar dos quadrinhos norte-americanos. Composta por doze capítulos oficiais e seis episódios adicionais a história narra as derrotas e conquistas do pato mais rico do mundo.  





Com grande competência, Don Rosa lidou com temas complicados como a morte dos país do Tio Patinhas, apresentadas de forma folclórica e poética. A página a seguir foi extraída de "O Bilionário da Colina Sinistra", nono capitulo da biografia do Tio Patinhas e ambientada em Glasgow, Escócia, no ano de 1902. Donilda O'Pata, mãe de Patinhas já havia falecido há cinco anos (fato narrado em "O Rei de Klondike", oitavo capítulo da biografia).

Neste capítulo, Patinhas que havia retornado para casa após conquistar fortuna na corrida do ouro em Klondike, decide se aventurar novamente pela América, já que não consegue se readaptar aos velhos costumes de sua terra natal.

A última página do capítulo mostra a partida do pato milionário e suas irmãs, Hortência (futura mãe do Pato Donald) e Matilda rumo aos Estados Unidos. Os irmãos despedem-se dos espectros dos seus país que acenam de uma das janelas do Castelo pertencente a família. 

Em seguida, Fergus e Donilda realizam "a passagem" guiadas pelo espírito de Sir Quackius, o ancestral que guarda o castelo. Percebam que no último quadrinho, o corpo do pai do Tio Patinhas repousa discretamente sob o lençol, iluminado pela luz do Sol que entra pela janela.

Para a ilustração, Don Rosa usou como inspiração a cena final do filme "O Fantasma Apaixonado" (1947) de Joseph L. Mankiewicz. No filme, uma jovem viúva se muda para a casa de um marinheiro já falecido e se apaixona pelo espectro do ex-morador.



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O velho novo Patinhas

Nas histórias de Don Rosa, o Tio Patinhas ganha novos contornos deixando de ser apenas um muquirana ganancioso. Na visão do autor, o pato mais rico do mundo é um homem com sede de aventura, conhecimento e diversão. 

A caixa forte não é apenas um grande depósito de dinheiro. Patinhas é capaz de rememorar todas as suas aventuras através de cada uma das moedas armazenadas nos 40 metros cúbicos de seu cofre gigante. 




O grande tesouro do pato mais rico do mundo são todas as lembranças de sua jornada em busca de riqueza, como explica Dora Cintilante (o grande amor na vida do Tio Patinhas).




A moeda "Número Um" também ganha um novo significado, deixando de ser um amuleto para se transformar na pedra fundamental da filosofia de vida do quaquilhonário: todo dinheiro deve ser ganho com inteligência, esforço e, principalmente, de forma honesta.



O tesouro favorito

Entre as histórias de Don Rosa, a minha favorita é "Uma carta de casa", publicada originalmente na revista Anders And & Co (Dinamarca) em 2004. Retornando ao cenário do Castelo do Clã MacDuck apresentado em "O Segredo do Castelo" (Barks, 1948), Patinhas e seus sobrinhos buscam um antigo tesouro templário escondido na propriedade.

Além da fundamentação histórica, quebra-cabeças, citações as histórias de Barks e piadas típicas das aventuras dos Patos, o enredo explora o relacionamento mal resolvido entre o Tio Patinhas, sua irmã Matilda e seus falecidos país. O fim da ruptura familiar, que durou 25 anos, acontece na página abaixo. Um dos diálogos mais tocantes e sensíveis já escritos para uma obra da Disney.


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O Tio Patinhas termina se reconciliando com o seu passado ao ler a última escrita por Fergus McDuck, seu pai. 

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Ao final de cada leitura, fica aquela sensação boa de que aquelas histórias da infância não ficaram presas a um tempo passado. Os personagens cresceram, amadureceram e se desenvolveram junto com seus fãs. 

Qualquer dia faço um post sobre a primeira história que li de Don Rosa e que se tornou instantaneamente uma das minhas favoritas. Mas vamos deixar para uma próxima vez.

see you!